Escolhera viver só. Achava que estaria melhor consigo mesma, acreditava na ciência, na lógica. Buscava um sentido. Pois tudo o que acontecia tinha de ter um porquê, mesmo que para ela fosse dificil compreender qual. Era cética. E mais: pagã, atéia e só. Era forte. Era fraca. Dependia. Do dia, dos porquês que encontrava pelo caminho, das contas que tinha a pagar e, principalmente, do ciclo menstrual que insistia em desregular o seu senso-de-humor. Vez ou outra, abria as janelas de casa e tinha uma dimensão maior de sua história. Via seu espaço e a mata ao redor: aquele silêncio fazendo cama para solidão; a certeza da segurança que vai além de chaves e fechaduras; a desesperança de qualquer visita ou mágoa sem aviso prévio. Assim era a menina: excessivamente só. Insistia na solidão, afinal, era muito mais tranquila a sobrevivência longe do convívio com as pessoas do mundo. Evitava a intimidade. Encontrava em curtas saudações uma maneira fácil e prática de lidar com as situações cotidianas. Por isso, esforçava-se ao esboçar expressões como: "Boa Tarde", "Como Vai?" e "Até logo". E era só. Nos momentos de crise, sentia-se melhor ao constatar que poderia, a qualquer momento, optar pelo abandono de si mesma. Fazia-se livre para se reinventar como melhor lhe conviesse. Sentia-se sorteada por ter direito às escolhas da vida e, dentre tantas, talvez a mais acertada tenha sido essa. Escolhera viver só. Achava mesmo que estaria melhor consigo própria .
não verei mais teus olhos, não sentirei mais teu cheiro, o perfume do absurdo, a surpresa do inesperado, a magnífica diferença do seu ser, ou outrora magnífica agora a breve semelhança do comum, do esperado do simplificado, mundo pequeno, sorte pequena e só
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